domingo, 8 de julho de 2012

Entrevista - Carlos Lopes (Dorsal Atlântica)

Entrevista por: Gustavo Carneiro
Fotos: Sérgio Filho     


Carlos Lopes dispensa apresentações, figura ímpar e um ícone do Rock underground, ele agora retoma a formação clássica da Dorsal depois de 22 anos. Nessa entrevista ele fala sobre a volta da Dorsal, Oscar Wilde e antropofagismo.

                               


Você ficou surpreso com o sucesso da campanha para o novo disco da Dorsal?
Já está fazendo um mês do fim da campanha e te digo que foi bem cansativo, como não poderia deixar de ter sido. Pressão pura em 45 dias. É muito comum, que a maioria das pessoas tendam a desconfiar, encontrar explicações estafúrdias para sucesso e fracasso, mas nenhuma dessas respostas me serve porque eu não penso ou raciocíno como a maioria e não faço política de conchavo. Muitos podem ler essas linhas e quererem mais uma vez dizer que sou, como li durante a campanha, megalômano ou visonário, tanto faz, são apenas palavras. Sempre fui pró-ativo, sempre aceitei os bônus e os ônus de minhas escolhas. Agora sou visto como vitorioso, já fui visto como fracassado. Como se vê, são apenas julgamentos, mas nunca fui desonesto com meus princípios e valores. Guerreiro só morre de pé.

Qual foi o público que mais apoiou o projeto? Os novos ou os antigos fãs? 
Tenho a lista completa mas ainda não parei para avaliar estatisticamente, mas pelo que vi, acho, que 70% foi de novos fãs. Ainda preciso de um tempo para pensar sobre isso. Agora, eu acredito que pessoas mais novas são mais pró-ativas e mais conectadas com as novidades, com novas possibilidades como o financiamento coletivo, e que os antigos fãs ainda não estão vivendo os dias atuais, vivem ainda meio que em um passado que nada faz por nós nem por ninguém.

Essa independência que o financiamento coletivo proporciona vai servir para que as gravadoras percam ainda mais o seu poder?
Minha intenção não é tirar poder de ninguém, e creio que todos que entram em campanhas de financiamento, pensam da mesma forma. Nós, os artistas, só queremos viabilizar nossos projetos. Tentei durante 3 anos, captar recursos na iniciativa privada e estatal, para meus livros, CDs e DVDs e nada consegui... Ouvi que não iam me financiar porque eu não era a Ivete Sangalo. Não nasci para fazer política. Conheço quem conseguiu bancar projetos, mas todos têm padrinhos e “conhecimento”, ou seja referendam o velho Brasil escravocrata, de Elite para Elite. Vendo que não ia conseguir nada dessas forma, lutei com minhas armas, armas que incomodam os politiqueiros: transparência e honestidade. O que fiz? Lidei diretamente com os interessados, os fãs, sem ter que recorrer à política. Essa campanha foi muito, mas muito revolucionária. Virou essa cena de cabeça para baixo.

Pensa em usar o sistema de financiamento coletivo para outros projetos?
Quem sabe... Preciso fazer nosso melhor disco antes. Uma coisa de cada vez. Não coloque a carroça na frente dos bois.

Quando você começou a pensar de forma mais concreta na volta da Dorsal?
Nunca pensei na volta da banda, só segui uma sincronicidade: quando nos chamaram para tocar como headliners no "Metal Open Air" no Maranhão, com abertura do Exodus e Anthrax, senti que a demanda era enorme e que precisava ser atendida.

                            

Existe algum projeto para o lançamento em vinil do novo disco?
Sim. O disco será lançado em vinil e  compacto. Talvez em inglês, ainda é cedo para ter certeza. Mas os LPs serão lançados, sim.

Você pensa em incluir nos shows da nova tour as músicas "Guerra" e "Ela não acaba assim"
da primeira demo da Dorsal Atlântica? Acho que tem a ver com o contexto do novo disco.
Não penso em shows, e nem no passado. Primeiro, o disco, sempre o disco em primeiro lugar. Preciso me dedicar 24 horas a esse trabalho. Preciso dar o meu melhor. Estamos estudando que agência nos   representará e quais profissionais serão responsáveis pelos shows, agendamentos e licenciamentos.

O quê você acha dessa onda de shows comemorativos com as bandas tocando na íntegra álbuns clássicos?
É uma questão de demanda, sempre é.


Quando foi lançado o "Ultimatum" o Brasil voltava a ser um país democrático. Agora nós temos uma ex.guerrilheira, uma pessoa que foi torturada e sobreviveu ao regime militar como presidente do Brasil e a Dorsal vai lançar um novo disco. Quais paralelos você vê entre esses dois momentos?
Você sabe que eu tenho pensado muito nisso, sobre as incríveis sincronicidades que estão ocorrendo em 2012. Sim, quando começamos estávamos na ditadura e mesmo assim, tive a ousadia de enfrentar as "verdades" e os críticos. Conto no livro Guerrilha! como eu era discriminado no colégio por ser cabeludo e gostar de rock, me consideravam alienado, porque eu não seguia cartilha. Votei na Dilma e isso não me fez ser menos crítico. Tenho acompanhado com interesse os trabalhos da Comissão da Verdade e para ela, escrevi uma composição para o novo CD. A letra fala do ponto de vista do trabalhador que pega condução lotada, e não do intelectual.

Por falar em "Ultimatum" o que achou do relançamento em vinil?
Uma coisa linda de se ver e ouvir.

Ainda sobre o "Ultimatum". Hoje eu vejo influências de The Stooges, MC5 e Punk 77 no disco.
Vocês tinham essas influências?
Na verdade não, mas tá na cara, para bom entendedor, que a gente nunca tocou “metal”, da forma que querem acreditar. Por isso o rótulo metal punk, punk metal, hardcore metal era mais adequado, mas a  Dorsal sempre teve fortes elementos de rock and roll, e como você mesmo colocou, éramos pré-punks sem saber. Isso é lindo demais. E viva o Ultimatum!

Você acha que a Dorsal sofre da mesma sindrome que AC/DC e Motörhead sofrem? De serem caracterizados como uma banda de Heavy Metal sendo que musicalmente são muito mais que isso?
Claro que sim. Para mim, tá na cara, mas as bandas que você citou são musicalmente diferentes da Dorsal, que milita em um território bem mais amplo.

De que forma as experiências que você teve pós Dorsal Atlântica vão influenciar no novo disco?
De muitas formas. Não dá para tocar como tocávamos em 1986, é impossivel e seria patético, se fazer passar por algo que voce não é. O disco homenageará o passado, é claro, mas será com a nossa pegada atual. Quando falo que eses será um dos 5, ou até mesmo dos 3 melhores discos da Dorsal, não estou brincando.

Tem influência do Oscar Wilde no disco novo?
Há há há. Sim!

E o conceito de antropofagia pelo modernismo brasileiro? Te influenciou de alguma forma?
Sempre influenciou e sempre influenciará. A nova versão do livro Guerrilha! começa com uma citação ao modernismo. Oswald de Andrade, Mário, Tarsila, Anita, Graciliano Ramos, Villa-Lobos entre outros, para mim, são como Deuses.

Se fosse possível voltar no tempo. Em que movimento artístico brasileiro você gostaria de ter feito parte? 
Mais do que arte gostaria de ter vivido a política dos períodos de  Dom João, dos dois Pedros, e da República Velha. É difícil falar em arte pois por exemplo, um ídolo, que é Monteiro Lobato, considerava os modernistas colonizados e eu me considero nacionalista, mas amo o modernismo. Gostaria de ser tudo-ao-mesmo-tempo-agora.

Qual filme você gostaria de sincronizar as sua músicas com as imagens ou então ter feito a trilha sonora: "Deus e o Diabo na Terra do Sol" ou "O Bandido da Luz Vermelha"?
Sem dúvidas, "Deus e o Diabo", até mesmo pelo título. Amo, amo, amo os cineastas brasileiros dos anos 60. Todos.

O que você pretende fazer num futuro próximo?
Ser pai.

Você consegue imaginar a Dorsal Atlântica sem você na formação?
Você consegue imaginar Karl sem Marx? Jesus sem Cristo?



http://dorsalatlantica.com.br/

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